O NAUFRAGO VOADOR
- Jones M. Coelho
- 23 de jun. de 2016
- 4 min de leitura

Não sei se deveria estar escrevendo isto. Não deveria, ou deveria? Não sei. Eis o dilema: escrever ou não escrever. Mas seu eu não escrever o que tenho para contar, ficarei louco. Tenho de me ocupar com algo, se nada fizer, à inanição serei entregue. Então se nada há de ser feito, vamo-nos aos fatos.
Hoje é dia 10 de setembro de 2035. Faz dois anos que aqui estou preso. Sou o primeiro comandante da FAB Senoj Elhoco. Estou preso em uma das milhares de ilhas do Pacífico.
Se caso este diário sobreviver mais que eu, esperou que um dia venha a ser encontrado. Então para tanto, acho que deveria começar pelo início da minha estadia não tão desejada.
Era 3 da madrugada da manhã do dia 7 de setembro de 2033, feriado de Independência, e eu estava a caminho do hangar 5106-J para preparar o meu Mirage 2000, pois, iria participar junto ao meu esquadrão a uma apresentação no desfile em Brasília.
Quando era 7 da manhã, já estávamos aos arredores da capital e eu e meus piloto começamos as manobras. Depois de cerca de 10 minutos de apresentação, a Torre entrou em contato:
- Alô? Alô? Aqui é a Torre, alguém na escuta?
- Afirmativo Torre! Contato estabelecido! Algum problema? - respondi.
- Comandante, três jatos F-5 invadiram o nosso espaço aéreo na região oeste do estado do Amazonas. O general requisitou interceptação imediata.
- Ok! Estou a caminho.
- Copiado! Boa sorte Comandante.
Com isso, parti com a velocidade máxima que pude naquela circunstância e já acionei o sistema de armas. Quando detectei os alvos no radar fiquei mais atento. Cerca de 10 minutos depois, já tinha contato visual.
- Comandante tente estabelecer contato! – disse a Torre.
Peguei o comunicador e ordenei:
- Aqui é a FAB, vocês invadiram o espaço aéreo brasileiro, pousem ou serei obrigado a persegui-los e abate-los.
Nada. Ninguém respondia. Então do nada eles bateram em retirada em direção ao Peru.
- Comandante, aqui é o general Matov Votam, você tem permissão para persegui-los mesmo que isso consista em passar pelo espaço aéreo peruano.
Com essa ordem, dei um salto hipersônico e passei a persegui-los. Eles eram rápidos, cortamos o Peru em questão de segundo e logo deixamos a ilha Isla Santa Cruz para trás.
Estava em plena perseguição quando os três potenciais inimigos fizeram uma formação em triangulo ao meu redor, e o de trás lançou um míssil. Estou perdido pensei eu, mas no último segundo dei um giro de 360° lateral e o míssil passou reto e atingiu a aeronave da frente. Senti uma onda de emoção e já ia comemorando, quando uma saraiva de tiros acertou a carenagem do meu jato. Agora sim me ferrei, pensei. Como último recurso, ao ver os dois inimigos faltantes se aproximarem de mim, acionei o protocolo de autodestruição e ejetei. Quando fui lançado para o alto, tive a satisfação de ver o meu jato explodir e levar os outros dois com ele.
A alavanca para abrir o paraquedas estava ao meu alcance, mas quando a acionei - como já devem ter imaginado- ele não abriu e comecei o meu mergulho em queda livre de 11Km de altura.
Apesar do medo, a vista do mar se aproximando era espetacular. As águas azuis, pacíficas e com a sensação de infinitas.
Cada vez mais o Pacífico ia se aproximando e eu não cessava de tentar acionar a alavanca.
Faltava menos de 100 metros para o meu fim de curso e eu já tinha desistido. Só estava esperando o impacto. Só para livrar a consciência, que logo deixaria de existir, acionei a alavanca uma única vez e, adivinha, o bendito abriu.
Planei até chegar a uns 5 metros da água e então outra onda de azar veio sobre mim: a corda do paraquedas quebraram. Então lá fui eu mergulhando desacordado nas águas frias do oceano Pacífico.
Dias depois eu acordei na areia da praia da ilha em que estou agora. Sim, eu sabia que foram dias depois, pois meu relógio marcava.
Ao acordar, estava todo molhado e com gosto de sal e areia na boca. Ao me lembrar do que tinha acontecido, levantei-me rápido. Quando já estava em pé percebi que não sabia onde estava nem como havia chegado ali. Peguei meu comunicador e tentei estabelecer contato com a base:
- Alô! Alô! Aqui é o comandante Senoj! Eu estou bem! Repito, eu estou bem!
Ninguém, pelo que percebi nem sequer o sinal tinha saído da ilha. A partir daquele momento a dura realidade de que ficaria sem comunicação com o continente me acertou em cheio.
Ao desligar o comunicador, dei uma volta e Meu Deus. A paisagem que vi naquele momento foi a vista mais linda que já vi na minha vida. Até hoje não entendo como não a tinha notado assim que acordei. A visão era maravilhosa. A areia era de um amarelo dourado, sequíssima. Cerca de 50 metros do mar havia um conjunto de palmeiras dispostas aleatoriamente em uma ordem perfeita. Mais para trás tem uma floresta densa, com árvores de todos os tamanhos e de uma folhagem de um verde escuro vivo. E no plano de fundo erguia-se duas montanhas - tão simétricas que parecia terem sido cortadas ao meio – com uma fenda entre elas que aprendi a temer.
Está tarde e a luz do dia está acabando. Então amanhã continuo meu relato.
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